Povos indígenas e psicologia Junguiana: tempos de solidariedade e aprendizagem na pandemia
Diante do contexto da COVID-19, as aldeias dos guarani viveram situações difíceis de serem conciliadas, tanto do ponto de vista da autonomia, como da sobrevivência econômica. No entanto, ressaltamos experiências de pesquisa que vivemos com os Guarani, de engajamento reflexivo e de solidariedade, numa perspectiva de pesquisa participante e colaborativa, ressaltamos a relevância de estarmos enquanto psicólogos junguianos e educadores, em parceria de reciprocidade, que se dá no reencontro com as ancestralidades indígenas, tanto do ponto de vista teórico, quanto vivencial.
No Rio Grande do Sul, segundo dados do IBGE (2010), há uma população de aproximadamente 33 mil indígenas, que representam cerca de 0,33% da população do Estado. Vivem em mais de uma centena de aldeias ou terras indígenas, localizadas em diferentes regiões do Estado, com predominância de quatro etnias identificadas: Kaingang, Guarani, Xokleng e Charrua.
As comunidades indígenas, no Rio Grande do Sul, antes da determinação do isolamento social decorrente da Pandemia do COVID-19, já enfrentavam inúmeras dificuldades, principalmente em razão da pouca efetividade das políticas públicas específicas ou do gradual desmonte daquelas ainda vigentes. A situação de isolamento social veio agravar essa situação, principalmente em relação à autonomia, à mobilidade e à sustentabilidade econômica das comunidades indígenas.
Durante o período de isolamento, observamos que as comunidades indígenas têm contribuído para importantes reflexões em diálogos que nos ajudam a desenvolver a ideia de pesquisa como prática social, num contexto de luta, diante do qual nos posicionamos. Nessa perspectiva, buscamos aprofundar a vivência de solidariedade enquanto uma experiência de reciprocidade como processo de encontro com as cosmologias indígenas.
Uma ação demarcadora da pesquisa como produção de experiência foi a realização de dois cursos de extensão na modalidade on-line. O primeiro curso de extensão “Morte e Renascimento da Ancestralidade Indígena na Alma Brasileira” buscou aproximar os estudos indígenas do campo da psicologia e da educação. Buscamos aprofundar uma reflexão sobre as ancestralidades indígenas e a alma brasileira, bem como contribuir com a formação dos profissionais da educação básica e psicólogos, ampliando a compreensão sobre as epistemologias indígenas.
O interesse pelo curso foi surpreendente, com participantes pessoas de todo o Brasil. Essa ação contou com a promoção e parceria do grupo de pesquisa do CNPq “Peabiru: educação ameríndia e interculturalidade”, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), o Instituto Junguiano do Rio Grande do Sul, do Instituto Junguiano do Rio de Janeiro, do Departamento da Alma Brasileira da Associação Junguiana do Brasil, da Escola Gaúcha de Biodança e da Editora Vozes.
Dessa experiência, surgiu a ideia de um novo curso Renascimento da ancestralidade indígena. Esse segundo curso teve a participação de psicólogos junguianos e indígenas das etnias Munduruku, Guarani e Baniwa. Em diversos momentos desses cursos, o interesse pelos conhecimentos indígenas foram ressaltados como necessários e emergentes para a compreensão do humano, da psicologia e da educação. A palavra dos indígenas foi valorizada como um nascedouro de epistemologias ameríndias que podem reorganizar didáticas de salas de aula, práticas de psicologia clínica junguiana, compreensão de conhecimento situado num solo próprio, enraizado, o significado da existência, a espiritualidade, a arte e a interculturalidade.
É dessa forma que nos situamos nesse dia 19 de abril de 2021, atualizando e rememorando as nossas ancestralidades indígenas em trabalhos pautados no respeito e nas aprendizagens de vida e de saúde!
Ana Luisa Teixeira – Psicóloga junguiana (IJRS/AJB) e professora dos Programas de Pós Graduação em Educação e Psicologia da UNISC.